Imaginando como descrever o
potencial de transformações que a Filosofia possui, lembrei-me de um antigo
exemplo meu, nascido em sala de aula e já muito repetido, por mim e por outros,
mas que, até onde eu saiba, ainda não havia sido descrito em um texto.
Quando dava minha aula
explicativa sobre a Filosofia que praticamos, voltada para a construção do
homem e para a transformação da sociedade, um jovenzinho, aparentemente
bastante ansioso, disparou uma indagação ousada e desafiadora, embora não muito
original: ”Você quer dizer que vamos ajudar a humanidade ensinando Filosofia?
Que coisa mais teórica e inútil! Muito melhor seria sairmos, todos nós, às
ruas, distribuindo alimentos, remédios e outras coisas mais necessárias!”
Curiosa a arte da pedagogia,
quando a amamos: ao invés de despertar a nossa ira, o desafio provoca a nossa
imaginação, e posso dizer que, em situações como esta, nasceram meus melhores
exemplos e reflexões. De maneira bem tranquila, propus a ele o seguinte
exercício de imaginação: há uma falha na telha e uma infiltração no forro desta
sala em que estamos, e uma insistente goteira provoca uma poça d’água bem no
meio da sala. De acordo com a reação ante este simples e banal fato, podemos
dividir a humanidade em três grupos...
Primeiro grupo: os “alienados”.
São um tipo curioso: não veem nada senão aquilo que lhes traz vantagens
pessoais e imediatas. Em relação a todas as outras coisas (inclusive poças
d’água), pisoteiam-nas de forma, quando não inconsciente, pelo menos
indiferente. “Poça d’água? Aaah... problema dos donos desta escola!” Se a poça
ocupa um espaço público: “- Problema do Governo! Eu pago meus impostos...” E
sai, alegremente e sem culpas, deixando suas marcas de lama pelo mundo.
Segundo grupo: os “bem
intencionados”. Como o próprio nome diz, têm boa vontade e costumam reagir
rápido: “ – Sujeira? Deixa comigo: pano, rodo e detergente, um pouco de
exercício físico, e... lá se vai ela!” É fato: lá se vai... e lá se vem, pois
a goteira não cessa. Nem cessa o trânsito intenso de alienados com sapato sujo. E aí,
começa o drama interminável: limpa/suja, limpa/suja, limpa/suja... Acontece que
nem o pano, nem o rodo, nem o detergente ou mesmo o próprio bem intencionado
são eternos. Um dia, o esforço cessará, e o mal estará de volta em minutos.
Podemos deduzir, então, que há boa intenção, mas muito pouca eficácia.
E o terceiro grupo? Aqueles que
se intitulam “filósofos”, ou seja, buscadores da sabedoria, não descartam a
importância de limpar o chão, pois não há como ver com clareza em meio a tanto
caos. Mas, realizada esta tarefa, farão imediatamente a pergunta crucial: “-
Qual é a causa deste problema?”. Olharão, então, para cima e detectarão a raiz
da dificuldade. Próximo passo: consertar telha e forro! Finda a causa,
findo o efeito, ou seja, ação bem intencionada e eficaz.
“Só o ingênuo acredita que as
causas da miséria física estão no plano físico; as causas da miséria física
sempre estiveram e estarão na miséria moral, psicológica e espiritual do
homem.” Ou seja, há mesmo que levantar a cabeça e “olhar para cima” para
encontrar as causas. Você acredita que a fome é devida à falta de alimentos ou
de fraternidade? e a pobreza? Deve-se à falta de bens materiais ou de
honestidade? E a ignorância e a maldade? É falta de acesso aos bancos de escola
ou de formação moral para usar estes conhecimentos de forma humana e não egoísta?
Como diria o sábio Arquimedes:
Eureka! Encontrei! Torna-se óbvio que necessitamos mesmo de Filosofia para
construir homens! E necessitamos mesmo de homens de verdade para mudar o mundo!
E devo ser eu o exemplo de que isso é possível, pois eu sou o mundo que me corresponde
mudar agora. Todas as nossas reflexões, ao longo deste texto, foram inspiradas
nos conhecimentos de alguns homens, sempre poucos, na história, que ousaram dar
exemplo de uma condição humana digna através de suas obras e de suas vidas; ou
seja, foram filósofos, com boas intenções e eficazes até nossos dias. Não é um
bom desafio? Talvez um dos maiores e mais nobres. Sinta-se desafiado!
Excelente história... Leva-nos a refletir o quanto perdemos tempo em remediar os efeitos sem identificar as reais causas do sofrimento humano...
ResponderExcluirExcelente história... Leva-nos a refletir o quanto perdemos tempo em remediar os efeitos sem identificar as reais causas do sofrimento humano...
ResponderExcluirHoje senti que esse dia seria muito bom! Não por esperar que alguma coisa boa aconteça, mas porque vou fazer tudo que puder para realizar o bem para o quem estiver comigo ou simplesmente passar por mim.
ResponderExcluirTenho aprendido muito com seus ensinamentos , reflexões e ações. Grata professora por sua inspiração para nossa construção humana.🌻